sexta-feira, 26 de outubro de 2012

BAIRROS DA CIDADE - XVI

  
2.3.3 - Bairro da Santo Ildefonso - III

Teatro Baquet inaugurado em 13 de Fevereiro de 1859 com a festa do Carnaval. Na noite de 21/3/1888 deflagrou um violentíssimo incêndio, provocado pela chama de um bico de gás de uma gambiarra do palco que pegou fogo a uma bambolina e que destruiu por completo o edifício, tendo provocado cerca de 120 mortos. Trataremos este assunto em pormenor em lugar próprio.

Grandes Armazens Hermínios – o maior armazem da cidade - construído no local onde esteve o Teatro Baquet, e inaugurado em 1 de Julho de1893. Teve iluminação eléctrica e um moderno elevador também eléctrico.

Interior em 1913 – O interior estava dividido em dois pisos, de muito alto pé direito, devido à diferença de nível entre as ruas de Santo António e Sá da Bandeira.
Os Hermínios eram também considerados uma instituição social, uma vez que abrangia cerca de 1.500 funcionários de todas as categorias. Dentro destas actividades sociais salientavam-se as excursões dos empregados, os grandiosos concertos, os “bodos aos pobres”, os saldos de ocasião e os balões oferecidos às crianças". Do blog Garfadas on Line



"Mas não só as crianças beneficiavam de presentes... Era costume oferecer brindes aos clientes fiéis. Os copos aqui apresentados, destinados a uso termal, são disso um exemplo. Manifestações precoces de marketing comercial. Estes copos das termas eram pintados ou serigrafados a óleo e tinham uma escala de graduação, para que a água tomada pelos aquistas correspondesse ao receituário médico". Do blog Garfadas on line - foto de Carlos Caria



Publicava anualmente catálogos dos seus produtos, que enviavam para todo o país, colónias e Brasil.


 Mais tarde, a C.G.D. construiu no mesmo local um importante balcão – Foto de Portojo

O Tripeiro Série V, Ano VI refere um artigo de Camilo Castelo Branco de 10/8/1857, em O Nacional: “Há uns poucos de nomes gloriosos a quem o Porto deve o seu progresso material. O primeiro na ordem dos factos e na cronologia é o senhor João Coelho de Almeida, criador da barcaça de banhos. O segundo é o senhor Lucas dos Santos, homem videiro que criou os banhos de tina (em 7/3/1854 na Rua de Santo António). A limpeza é a primeira condição de uma terra culta. As estatísticas de ambos os estabelecimentos provam que se lava muita gente. São beneméritos da Pátria todos os que fomentam a limpeza, perfeitas inteligências de sabonete”.
Lê-se ainda no referido Tripeiro: “Está aberto este estabelecimento todos os dias, de verão, desde as 5 horas da manhã até às nove da noite, e no Inverno, desde as oito da manhã até às seis da tarde. Aos Domingos fecha-se ao meio dia.
Por um banho de tina, da água doce 160 reis
Por assinatura( 12 banhos) 1$680 reis
Um banho sulfúrio (cada) 300 reis
Um banho de vapor 600 reis
Um banho de chuva 120 reis
Assinatura (12 banhos) 960 reis
Um banho de água do mar 300 reis
Em todo o tempo se pode ir tomar banhos de água doce, de chuva, de águas termais e de vapor. Os de água de mar só principiam no primeiro de Agosto e acabam em 31 de Outubro.” Aberta em 1866, esta casa recebia água do manancial de Camões conduzida por mina construída propositadamente. Foi fechada em 27/9/1909.


Tabacaria Africana – esquina da Rua de Santo António e Praça da Batalha – Pertenceu a António de Almeida Campos até 1902 e foi trespassada a Alberto Vieira da Cruz. Além de vender todos os artigos ligados ao tabaco, editava lindíssimos postais de costumes portugueses. Infelizmente a rica frontaria foi destruída há poucos anos.


Uma das mais belas casas do Porto na arte do ferro é a antiga Ourivesaria Reis, cuja fachada é dos últimos anos do séc. XIX.
Foi fundada em 1880 por António Alves dos Reis. Entre as muitas peças de grande valor e beleza por estes joalheiros executadas, destaca-se a fabulosa baixela manuelina executada entre 1899 e 1904. Foi desenhada por Rafael Bordalo Pinheiro e era composta por 513 peças. Foi encomendada pelo 3º. Visconde de S. João da Pesqueira (Porto 28/11/1862 – Paris 1/9/1925) e por sua morte a Viscondessa fez herdeiro universal o Paço Episcopal do Porto, onde a baixela se encontra.


Em 31 de Janeiro de 1891 deu-se uma revolta republicana da qual colhemos a informação seguinte:
“ A Guarda Municipal abrigada pelas varandas de pedra que guarnecem as escadas e patamares que dão acesso à Igreja de Santo Ildefonso … que permitem estabelecer como começou e desenvolveu o combate da Rua de Santo António… inesperadamente, e por via da falta de disciplina militar que a Polícia Fiscal não possuía, uma ou duas praças dessa polícia, saindo da forma fizeram 2 ou 3 tiros sobre a Guarda Municipal. O Major Graça (comandante da Guarda Municipal) … logo que ouviu aqueles tiros ordenou o toque de fogo às suas forças, reiterando-o, e mandando em seguida que se fizesse fogo vivo, pelo corneteiro sob as suas ordens… Refeitos, porém, dessa desordem e do espanto que causara o início da luta, em pequenos grupos, ou isoladamente, os soldados da revolta começaram um fogo nutrido contra a Guarda Municipal… até que as munições se lhes esgotavam”.  In A Revolta do Porto de João Chagas e ex-Tenente Coelho. Os números oficiais deram conta de 12 mortos e 40 feridos, embora os republicanos afirmassem que teriam sido 50 cadáveres os enterrados em vários cemitérios e muitos dos feridos tenham vindo a falecer depois.


Alves da Veiga proclamando a República da varanda da Câmara.

Chefes da Revolta de 31 de Janeiro 
Algumas centenas de revoltosos foram presos a bordo de navios ao largo do Porto, tendo cerca de 230 sido condenados a diversas penas de degredo e prisão.

Placa evocativa da Revolta do 31 de Janeiro

Monumento aos mortos do 31 de Janeiro no cemitério do Prado do Repouso – foto Eudora Porto


A Rua de Santo António onde se deu o encontro dos revoltosos e as forças fieis ao governo


Rua de Santo António em 1914

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

BAIRROS DA CIDADE - XV

 
2.3.3 - Bairro de Santo Ildefonso - II
 
A Junta das Obras Públicas decidiu construir a Rua Nova de Santo António  numa sessão de 1784, em cuja acta se lê: “...entre o Bairro de Santo Ildefonso e o do Bonjardim, se deviam abrir duas ruas de comunicação entre estes dois bairros na forma da planta que se acha delineada sobre o plano extraído do terreno intermédio. Que a primeira dessas ruas deve principiar a sua abertura na frente do pátio da Igreja dos Congregados e seguir a sua direcção em linha recta a desembocar na frente da Igreja de Santo Ildefonso…cujo declive se suavizará alteando o seu pavimento do princípio dela, e rebaixando o que for necessário no seu fim”. Começou a ser aberta em 1785.
 
 
No Boletim dos Amigos do Porto Nºs. 1 e 2 de 1960 encontra-se esta planta de 1793, desenhada pelo Arq. Teodoro de Sousa Maldonado, em que se podem ver as ruas: A - Rua Nova de Santo António, B – Rua de Santa Catarina, C – Santo Ildefonso, D – Congregados, E – Rua do Bonjardim, F – Calçada da Teresa. A Rua de Santa Catarina está aberta só até perto da actual Rua de Passos Manuel. A Rua Nova de Santo António ainda estava em obras, pois só ficou concluída em 1805.

 
 
 
Este tramo da muralha, a Norte do convento, foi destruído juntamente com ele. À direita ficava a Viela da Madeira e a Calçada da Teresa, personagem desconhecida e que desencadeia polémica entre os historiadores. Já vimos referidos os nomes de Calçada de Santa Teresa, de D. Teresa e da Teresa. Era a ligação a Cimo de Vila antes da construção da Rua Nova de Santo António. Em frente ficava o Botequim do Frutuoso, um dos primeiros do Porto.
 

 
Rua da Madeira - antiga Calçada da Teresa e Viela da Madeira, vistas do lado nascente. Antes da construção da Rua Nova de Santo António era por aqui que se fazia o trânsito de pessoas entre Cimo de Vila e a Porta dos Carros.
 
 
Projecto para Rua Nova de Santo António - Arquitecto António Pinto Miranda

“A sua construção, como é facil de imaginar, foi um tanto difícil devido à natureza ou topologia do local. Basta dizer que, os prédios nela erguidos têm mais andares para as traseiras do que para a frente, em vista da fundura em que os alicerces tiveram de ser cavados. Por esse motivo, foi a rua, em alguns pontos, assente em fortes arcadas de pedra que, por baixo, davam – e dão ainda- passagem de um para o outro lado. Na embocadura, teve de fazer-se uso de estacaria, por se espraiar até ali a chamada “mina do Bolhão” que abastecia de água o Convento de Avé Maria”. O Tripeiro Série VI, Ano IV.
Já um dia verificámos isto mesmo e descobrimos, na Rua da Madeira, uma entrada de serviço do Teatro de Sá da Bandeira, e outras passagens. Também na Rua de 31 de Janeiro existe uma entrada pedonal e com escadas para este teatro.
Devido a todas as dificuldades de construção a rua só foi concluída em 1805, já depois da morte de Francisco de Almada e Mendonça.
 
 
 Rua da Madeira- como se verifica, as traseiras das casas da Rua de Santo António têm mais andares, chega aos sete, que as suas frontarias – foto blog A Cidade Deprimente
 
 
Início da Rua do Bonjardim antes da demolição, em 1916, do Convento de S. Filipe de Neri dos Frades do Oratório. Com o alargamento desta entrada, passou a chamar-se R. de Sá da Bandeira. O início da R. do Bonjardim passou para junto do Café A Brasileira . Repare-se no candieiro a gás e no trânsito pela esquerda. Só em 1928 se começou a circular pela direita.
 
 
Visita de D. Manuel II ao Porto em Novembro de 1908 - início da Rua de Santo António. Ilustração portuguesa de 23 de Novembro de 1908

 
 

O mesmo local antes e depois abertura da Rua de Sá da Bandeira.
 
A Rua Nova de Santo António passou a chamar-se, em 30 de Agosto de 1874, Rua de Santo António dado o desaparecimento de Rua de Santo António da Picaria. Em 1910, e recordando a Revolta do Porto, passou a Rua 31 de Janeiro, mas em 1940 a C.M.P. repoz o nome de Rua de Santo António. Por fim, após a revolução de 25 de Abril, voltou a chamar-se Rua de 31 de Janeiro.

 
Prédios da Rua de 31 de Janeiro - varandas e janelas típicas do Porto
 
 
 
 
Em fins do século XIX existia neste local uma chapelaria chamada Chapéu Elegante cujo dono, em 1895, começou a adoptar o sistema de preço fixo nos seus artigos. No dia 2 de Março de 1905, abriu a Joalharia Miranda, Filhos & Duarte, cujas instalações se impunham pelo seu gosto artístico. A fachada que ainda hoje, felizmente, pode ser vista, é de ferro fundido estilo Luis XV.
 
 
 
Outra joia em ferro fundido e mármore 
 

 
Ainda hoje os portuenses usam o dito “isso é bera!” pretendendo depreciar alguém ou alguma coisa. A procedência deste dito vem do séc. XIX e refere-se a uma loja, que existiu na Rua de Santo António, que vendia joias falsas e que se chamava Bera Diamond Palace. Durante alguns anos foi um sucesso comercial. Pertenceu a uma estrangeira chamada Bera.
 
 

 

 

Quem se não recorda dos rebuçados para a tosse Lencart? E do pomito? Pois, a verdade é que o hipotético Mr. Lencart, “prestigioso farmaceutico parisiense”, não era senão o inteligente Sr. Álvaro Salgado, dono da Farmácia Central, no nº. 203, e que LENCART era um anagrama de CENTRAL. A verdade é que deve ter vendido milhares e milhares de caixas de rebuçados e de pomitos, um creme para todas as ocasiões. Desconhecíamos que tivesse havido uma moeda ou medalha e para que servia.

 
 
 



sexta-feira, 12 de outubro de 2012

BAIRROS DA CIDADE - XIV

 
2.3.3 - Bairro de Santo Ildefonso - I
 

Praça D. Pedro – Sec. XIX - Ao fundo os edifícios da Câmara com a estátua do Porto no frontão. Ao centro a estátua de D. Pedro IV e á direita o Convento dos Irmãos do Oratório de S. Filipe de Neri, mais conhecido por Congregados. Esta praça teve através dos tempos vários nomes e estava fora da Porta dos Carros e da muralha Fernandina. Chamou-se Casal de Paio de Novais e Fonte da Arca (durante o século XV); Praça da Natividade (depois de 1682, nome da fonte lá construída); Campo das Hortas (até 1711); Praça Nova das Hortas (depois de 1711); Praça da Constituição (1820); Praça D. Pedro (1833), Praça da República (Outubro de 1910) e finalmente Praça da Liberdade (27 de Outubro de 1910).
 
 
 Estátua de D. Pedro IV – Foto do início do sec. XX - Foi seu escultor Célestin Anatole Calmels. Fundida em Bruxelas, custou cerca de 30 contos de reis. Mandada fazer em 1862 para comemorar os trinta anos do desembarque no Mindelo, foi inaugurada em 19 de Outubro de 1866. D. Pedro segura na mão direita a Carta Constitucional de 1826. Uma adivinha muito antiga do Porto é: Qual é a pata direita do cavalo do D. Pedro? Responda quem souber!
 
Rua de D. Pedro - Destruída em 1915 para a construção da Avenida dos Aliados - à esquerda o Hotel Francfort

 
Convento de Nossa Senhora da Consolação dos Cónegos de S. João Evangelista ou Loios – D. Violante Afonso mandou construir em terreno seu, para sua sepultura, uma capelinha dedicada a Nossa Senhora da Consolação. Em 1490 o Bispo do Porto D. João de Azevedo, tendo vontade de construir um mosteiro para a Congregação de S. João Evangelista, recebeu os terrenos, por doação, e aí construiu o Mosteiro e Igreja de Santa Maria da Consolação ou de Santo Elói, fundado em 6 de Novembro de 1491. Em 1794 os frades foram autorizados a demolir a muralha que dava para a Praça Nova das Hortas e a construir um majestoso edifício com a frontaria para esta praça. Em 1833, por decreto de D. Pedro IV, foram os seus bens confiscados, não estando ainda terminadas as obras. A igreja e o mosteiro, virados para a Praça dos Loios, foram destruídos por estarem em estado ruinoso, em 1833. Esta gravura foi feita em plenas lutas liberais e várias das personagens parecem ser militares ou da Guarda Municipal. As pirâmides parecem ser material militar para a artilharia.
Nesta foto já se não vê a Fonte da Natividade, pois D. Pedro IV a mandou destruir logo que chegou ao Porto, em 1832, para alargar a praça.
 
 
Mais tarde foi adquirido por Manuel Cardoso dos Santos, brasileiro de torna viagem, que o comprou por oitenta contos de reis com obrigação de concluir o palácio segundo o antigo projecto, tendo sido terminado, em 8 de Junho de 1853, pela sua viúva. Daí, segundo Horácio Marçal, dever-se-ia chamar Palácio da Cardosa e não das Cardosas. Este grandioso edifício tem na sua totalidade 117 janelas e 39 portas. Em 1970 este prédio ainda pertencia aos descendentes da mesma família. Hoje está lá o Hotel Intercontinental.


Porta dos Carros, na muralha Fernandina, construída em 1521. Á direita o Convento de S. Bento de Avé Maria, Igreja dos Congregados, e à esquerda traseiras do Convento dos Lóios. 
 
 
 
Convento e Igreja dos Congregados antes de 1916. A Rua do Bonjardim ainda começa aqui. Vêem-se as escadas exteriores da igreja, que tinham sido alteradas quando da construção da Rua Nova de Santo António em 1785.
 

Igreja dos Congregados na actualidade. De notar os azulejos de Jorge Colaço. Já não existem as escadas exteriores; teriam sido destruídas quando da abertura da Rua de Sá da Bandeira em 1916?
 

Obras de construção dos túneis e estação de S. Bento no local onde esteve o Convento de S. Bento de Avé Maria. As obras da Estação de S. Bento foram iniciadas em 9 de Novembro de 1903.

Construção do túnel D. Carlos I, terminado em 1893. O ramal ligava Campanhã ao local onde esteve o destruído Convento de S. Bento de Avé Maria. Foto Alvão
 

Praça Almeida Garrett – fim séc. XIX – Foto Emílio Biel
 
 
Chegada do primeiro comboio à futura estação de S. Bento em Novembro de 1896 - Foto Alvão
 
 
Estação de S. Bento - a primeira pedra foi lançada por D. Carlos e D. Amélia em 22 de Outubro de 1900 e inaugurada em 5 de Outubro de 1916.
 
Sobre esta zona da cidade trataremos com mais pormenor em lugar próprio