quarta-feira, 28 de agosto de 2013

DIVERTIMENTOS DOS PORTUENSES - I

3.5 - Divertimentos


3.5.1 – Passeios no rio


Passeio em barco valboeiro de Avintes – Silva Porto


“Em tardes e noites mais acaloradas, os convivas divertiam-se nas chamadas “Fúrias do Rio”, nome mítico que se dava aos amenos passeios pelo rio, em barcos cobertos de toldos, jogando, comendo e deleitando-se ao som da música instrumental” Professor Doutor Francisco Ribeiro da Silva em O Tripeiro, Série VII, Ano XXIV, Nº.5 

“Durante o verão o folguedo perdilecto das famílias abonadas eram as merendas e os jantares pelo rio acima, a Quebrantões, ao Freixo, à Pedra Salgada, à Quinta da China. Aos Domingos, depois da missa primeira, o patrão trazia da feira do Anjo a provisão das laranjas e dos pessegos de Amarante, um melão afiançado, e a indispensável melancia. Um cesto levava as frutas, outro cesto maior e mais abarrotado, coberto pela alvejante toalha de linho de Guimarães levava os talheres, o alguidar de arroz de forno com o pato e o salpicão, a pescada frita, os grossos “moletes” de Valongo e a borracha atestada de vinho maduro da Companhia do Alto Douro. Fretava-se um dos grandes barcos de Avintes, remado por mulheres, um tanto escalavrado, destingido pelas solheiras, semelhante do aspecto da madeira e do cordame a uma velha nora descida para a água de uma horta ribeirinha, cheirando a brôa fresca a cebolinho e a feno. A famíla toda – o marido, de calça de ganga e chapéu de sol, o mulher, os filhos, a criada com roupinhas minhotas e os dois marçanos, em chinelas de bezerro compradas nas Congostas, camisa de linho caseiro, nisa de briche e chapéu braguêz de copa alta e aguga – tomavam metodicamente assento à ré, sob o toldo branco, rusticamente armado em varas de pinho, como um parreiral suspenso. O açafates com os víveres eram depostos à proa. Pela noite os que, tendo ficado na cidade, tomavam o fresco na alameda das Fontaínhas, viam em baixo na água túmida e glauca, polvilhada de ouro pelo reflexo das estrelas, deslizar de volta as barcas das musicatas, iluminadas das lanternas à veneziana, lentas, misteriosas”. Ramalho Ortigão – Porto 1850


3.5.2 – Jardim de S. Lázaro


Recolhimento de Nossa Senhora da Esperança


Convento de Santo António da Cidade – 1833 - quando foi reconvertido em Museu Portuense a capela foi destruída


Jardim de S. Lázaro – lago – ao fundo a Biblioteca Municipal


Fonte que estava na sacristia do Convento de S. Domingos, no Jardim de S. Lázaro 

“O topónimo originário provém do patrono do Hospital dos Lázaros que se supõe ter sido ali edificado durante o primeiro quartel do séc. XVI. Os lázaros eram os que tinham a terrível doença da lepra. 
Por disposição testamentária do Padre Manuel de Passos Castro a S.C.M.P. mandou construir o Recolhimento de Nossa Senhora da Esperança que começou a funcionar em 1734. Destinado a meninas órfãs de boa família desprovidas de fortuna presta, por consequência, uma assistência de características muito especiais. Tem uma linda igreja cuja fachada tem influência de Nazoni. 


O Campo de S. Lázaro, até ao terceiro decénio do séc. XIX, oferecia um aspecto de largo de feira com o cruzeiro do Senhor da Consolação e capela. Este em 1869, juntamente com o do Largo do Padrão, foi levado para o cemitério do Bonfim. 
Aí se realizava, desde 1720, a concorrida feira anual de S. Lázaro, desde o Domingo de Lázaro até ao Domingo de Ramos. Em 1876, dada a exiguidade do espaço foi a feira transferida para o Largo de Mijavelhas, hoje Campo 24 de Agosto, e que aí se conservou até 1899. Desde o ano de 1808 a 1833 juntou-se-lhe a feira de gado suíno que se realizava todas as terças e sábados. Em 1783 os frades Capuchos fundaram, no lado nascente, o Convento de Santo António da Cidade. Em pleno período do cerco, instalou-se lá o Museu Portuense, que em 1911 se veio a chamar Museu Soares dos Reis, que está, desde 1942, no Palácio dos Carrancas. Em 11 de Abril de 1842 foi lá inaugurada a Real Biblioteca Pública do Porto. Por ordem de D. Pedro IV foi o campo transformado em jardim, desenhado por João José Gomes e aberto ao público em 1834.” In O Tripeiro Série VI, Ano V.


Em 27/1/1833 - D. Pedro IV ordenou o ajardinamento de S. Lázaro.


O historiador Dr. Artur de Magalhães Basto descreve assim a vida deste jardim em meados do séc. XIX: “ Em dia de música, S. Lázaro é o ponto de reunião elegante. Quase se não cabe lá, tal é a multidão que ali passeia com ar endomingado e solene. Há bancos por toda a parte, mas os que primeiro se enchem são os que estão em volta do pequeno lago central. Vêem-se sentadas meninas (…) flanqueadas pelo terrível papá, que nestes momentos perde um pouco da sua costumada ferocidade (…) e que por isso, não repara nos leões namoradores, que lá ao longe, confundidos na turba, ou meio encobertos pelo arvoredo, lhes desinquietam as filhas. Enquanto a música dura, eles e elas fingindo-se absortos na contemplação inocente do jacto de água que repuxa o lago, trocam á sorrelfa olhares incendiários de mistura com suspiros e ais tirados do âmago do peito. O Jardim de S. Lázaro por 1850 era isto: um campo de batalhas de amor, onde não corria sangue, mas onde por vezes não faltavam lágrimas.”
Este belo jardim deixou de ser frequentado pela gente grada da cidade quando, em 1865, se abriram os novos jardins do Palácio de Cristal. Passou a ser frequentado por soldados, sopeiras, empregados de comércio etc.


De um forasteiro do sul de 1908 “ Nos centros de movimento portuense, vemos o contraste da senhora luxuosamente vestida caminhar ao lado da mulher de trabalho, suja e descalça, do janota acotovelar o carreiro imundo (ou lavrador, como lhe chamam no norte e dos ricos automóveis, tão abundantes no Porto, se misturarem com os numerosos e quase primitivos carros tirados pelos pequenos bois do Barroso, de cangas rendilhadas que fazem todos os serviços de carga necessários ao comércio da cidade”.

Houve, desde há séculos, locais onde os portuenses passeavam e passavm as suas  horas de ócio. Já nos referimos, em publicações passadas, ao Cimo do Muro, na Ribeira, junto à Fonte da Natividade, ao Jardim da Cordoaria, às Fontaínhas, ao Poço das Patas, ao Largo da Aguardente, ao Jardim da Arca d'Água, ao Parque da Cidade etc. Mais tarde trataremos, em pormenor, do Palácio de Cristal.


3.5.3 - Touradas


Real Coliseo Portuense – praça de touros no largo da Boavista



Descubram quantos homens não têm chapeu e bigode!


A tourada foi, no séc. XIX, um dos divertimentos preferidos dos portuenses. Horácio Marçal diz-nos que: «A mais remota notícia acerca de touradas na cidade do Porto, pelo que sabemos, data de 24 de Junho do recuado ano de 1785, e refere-se a uma corrida de touros efectuada, com todo o esplendor, por ocasião das luzidas Festas Reais, em praça especialmente construída para o efeito no lugar da Torrinha, à estrada de Cedofeita». Estas festas coincidiram com os festejos do casamento do Principe Herdeiro, futuro D. João VI, com D. Carlota Joaquina". 

Houve, mesmo que episódicamente, várias praças de touros no largo da Arguardente (Marquês de Pombal), Foz do Douro, R. da Alegria, Serra do Pilar e o Real Coliseo Portuense, na Boavista. Desta, podem ver-se, acima, 3 fotos. Inaugurada em 28/7/1889 por ela passaram os grandes cavaleiros, amadores e profissionais, da época: o marquês de Castelo Melhor, os viscondes de Alverca e da Várzea, D. Luís do Rego, Fernando de Oliveira, Alfredo Tinoco e Manuel Casimiro. A pé, matadores espanhóis da categoria de Guerrita, Espartero e Cara Ancha. Foi demolida no segundo semestre de 1898, pois nunca foi rentável. Na tourada inaugural os bilhetes custavam o seguinte: Sol, 300rs; Sombra,600rs; Tribuna, 1200rs; Camarotes de Sol, 3.000rs; Camarotes de Sombra, 4.500rs.Tinha cerca de 8.000 lugares. Por ela passaram os melhores toureiros e cavaleiros do tempo.


Praça de Touros da Rua da Alegria - inaugurada em 4 de Maio de 1902, era de madeira, ao gosto árabe, com uma lotação para 7000 pessoas.

Desenho de Laura Costa

Em Junho de 1902 o matador Emílio Torres (Bombita I), depois de uma elegante e corajosa exibição, pegou numa vara e saltou para cima do touro, aí permanecendo pouco tempo. Derribado, caíu na arena,mas nada de mal lhe aconteceu. Uma espantosa ovação e gargalhadas ecoaram no anfiteatro.
Em 1920 esta praça já não existia, pois nesse ano formou-se a Sociedade Tauromáquica Portuense, com o fim de construir uma grande praça de touros na Areosa. Esta praça, foi palco de corridas, mas também de outros espectáculos. Ardeu em 1926, num incêndio que em quarenta e cinco minutos a reduziu a cinzas. Foi esta, de acordo com Horácio Marçal, a última praça de touros do Porto.


Nesta praça também houve subida de balões tripulados.

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