terça-feira, 19 de julho de 2016

AS ARTES LIBERAIS E FABRIS - I

6.23.1 – As artes liberais e fabris



1780/1785 – Estudo de Cândido dos Santos

Os artistas que exerciam actividades de trabalhos manuais criaram associações de profissão que eram uma forma de os socorrer contra o desemprego, a doença e demais infortúnios. Constituíam-se ao modo de Confrarias. Tinham em muitos casos uma capela por sede e um Santo por padroeiro. Estas associações, tinham diversas finalidades. “ A regulamentação não se inspirava unicamente em preocupações de classe, mas sim num alto anseio de honestidade profissional e solidariedade social. Os regimentos ou estatutos dos ofícios reprimiam severamente as falsificações, as fraudes, a obra apressada… para bem se assegurar probidade e perfeição dos trabalho, levava cada objecto o nome ou a marca do artista que o fabricava…Relativamente aos mestres, oficiais e aprendizes, bem como às suas famílias, havia um sistema para o tempo bastante eficiente de protecção na doença, na viuvez, na orfandade, nos sinistros, nas perdas negociais. Impressionante é o número de hospitais criados, geridos ou sustentados por homens e mulheres ligados aos ofícios. Estes também funcionavam “como recolhimentos para velhos ou inválidos e albergues para viandantes. As despesas de funcionamento eram asseguradas pela corporação… Mas o verdadeiro espírito institucional afirmava-se mais fortemente ainda naquilo que hoje chamamos solidariedade social". Boletim de 2006 da Associação Cultural dos Amigos do Porto.


Alfaiate Giovanni Battista Moroni – séc. XVI



“A Praça esteve à conversa com 3 alfaiates portuenses e descobriu que a alfaiataria ainda sobre)vive.
Coser, entretelar ou enchumaçar ainda são termos comuns na Invicta. Se acha que a alfaiataria já deu o que tinha a dar, continue a ler este artigo. Alexandre Ferreira, Vítor Gonçalves e Augusto Saldanha são o exemplo vivo de que a arte ainda vive. A Praça esteve à conversa com estes 3 alfaiates portuenses e descobriu que há mesmo quem não prescinda dos seus serviços.
Alexandre Alfaiate
A Alexandre Alfaiate já faz história na Praça Coronel Pacheco há 80 anos, mas só desde 1962 é que pertence a Alexandre Ferreira. O rapazito que aprendeu a dar os primeiros pontos numa alfaiataria da vila de Mesão Frio aventurou-se com 13 anos na Invicta e acabou por herdar, anos mais tarde e por algumas patacas, o negócio do patrão.
A vida “mudou sempre para melhor” e, hoje, Alexandre, com 77 anos, tem clientes de classe média-alta que já são amigos e que, como não sentem a crise, continuam a bater-lhe à porta.
Com fatos acima dos 900 euros, não é qualquer um que tem um smoking com a etiqueta do Alexandre. “Estou agora a fazer um fato que vai chegar aos 3.500 euros, em pura caxemira. É para uma pessoa muito conceituada cá no Porto”. E o preço nem é assim esticado porque o fato dura muito, mas “o toque é maravilhoso”, explica Alexandre.
“Isto não é como a confecção em que é sempre a mesma coisa e as máquinas é que fazem tudo… é muito difícil”, realça o alfaiate.
E a verdade é que para além do toque ou da forma como “a obra assenta no corpo”, a verdade é que os alfaiates respeitam os tecidos. Não havendo colagem da tela interior, como nas confecções, o fato mantém as condições de ventilação.
Augusto Saldanha
A oficina de Augusto Saldanha esconde-se num primeiro andar aconchegado da Rua Trindade Coelho. Com 60 anos, Saldanha, como é conhecido, é alfaiate há 45.
Aprendeu com o irmão o que tinha para aprender, mas foi no Porto que se tornou artista e se apaixonou pela arte. Dos clientes de classe média-baixa passou para os clientes da média-alta e agora sente-se realizado. “Tenho clientes que vestem o meu fato como uma peça de arte”, conta.
Veste os Pessanha, os Sotto-Mayor, os Portela e outras figuras da cidade, mas o que o deixa verdadeiramente orgulhoso é Paulo Portas, que apelida de “seu manequim”.
Saldanha não fala em preços, mas diz que só não sente a crise porque mudou a clientela. “O meu cliente antigo não tem poder de compra. Hoje, um caixa de um banco não pode fazer aqui um fato, não tem possibilidades económicas”.
Para Saldanha, os clientes são amigos que fazem do seu gabinete de provas “um confessionário”, afirma.
A. Gonçalves
Alfaiate há 42 anos, estabeleceu-se na antiga oficina do pai, na Rua Galeria de Paris, e foi ganhando os seus próprios clientes, também oriundos da classe média-alta. Mas Vítor Gonçalves não veste amigos. “A relação com os clientes é uma relação profissional. Muitas vezes, roça a amizade, da parte deles para mim”, afirma. E a consideração que eles têm com este alfaiate, é das coisas que mais o orgulha.
Na A. Gonçalves, já lhe pediram de tudo, desde “um vermelho muito vivo” a casacos com os bolsos para trás, com capuz de frade ou com um chapéu de pescador. Os clientes, às vezes, “obrigam a inventar um bocadinho”, o que não seria possível numa confecção artesanal.
Mas qualquer fato, mais estranho ou mais comum, leva a sua marca. “Todos nós podemos fazer a mesma coisa, que nunca será igual. A marca fundamental que fica menos perceptível é o estilo de cada um”.
E Vítor é o único dos 3 alfaiates que diz sentir a crise. “Comparando o que fizemos em outras alturas com o momento actual, sim. Os clientes não desapareceram, mas se antes fazia 6 calças por estação, agora faz 3”.
E afinal, que futuro para o alfaiate?
Saldanha acredita que “o alfaiate nunca vai acabar. Acabaram muitos e os bons ficaram” mas Vítor já não é tão optimista.
Só há 2 coisas que estes 3 alfaiates têm em comum: têm todos muito trabalho e nenhum deles tem a quem passar o testemunho. Um facto incompreensível, porque a arte parece ser cada vez mais procurada por jovens e, como diz o senhor Saldanha, actualmente, “é o filho que traz o pai”.
Em altura de crise económica, o investimento seria favorável. Fica o conselho, para não deixar morrer a arte – e a oportunidade”. In Porto 24

Alfaiates - vídeo




Sedeiro e assedadeira de linho – Após a colheita o linho é ripado na eira para separar as sementes; posto em ribeiras 3 semanas a apodrecer a casca; seco ao sol; maçado para partir restos da casca; espadelado para retirar totalmente a casca; sedado pelas assedadeiras para separar as fibras mais finas e compridas das mais grossas e curtas (estopa); fiado na roca e no fuso; dobado no sarilho.


Barbeiro, sangrador e tira dentes


"Barbier de Village  - tableau du célebre peintre portugais" J. Malhoa - postal com selo de 27/8/1912





“ Antigamente (fim do séc. XIX) há sessenta e tal anos, nos arredores do Porto, algumas barbearias tinham por cima da porta uma bacia de metal amarelo, com recorte semicircular e um grande queixal de madeira, pintado, pois alguns mestres barbeiros também tiravam dentes, ou por outra, arrancavam-nos com o alicate à força de pulso! E o paciente sujeitava-se, porque pagava menos, embora visse as estrelas ao meio dia! Anestesia era coisa fora do conhecimento do barbeiro. Tinham que servir os tanoeiros e “matulas” dos armazéns de vinho do Porto que trabalhavam de sol a sol, mas que nesses dias despegavam às 3 horas da tarde. Estes trabalhadores viviam nos arrabaldes tendo de andar a pé 2, 3 e mais léguas, e queriam chegar a casa barbeados para na manhã de Domingo irem à Missa com decência. Nesse tempo havia uma barbearia… que nas noites de sábado para Domingo reunia melhor freguesia, e lá se estava até à uma ou duas horas da madrugada à espera de vez… Naquele tempo uma barbeadela custava 30 a 40 reis”. O Tripeiro, Série V, Ano V.

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