terça-feira, 27 de dezembro de 2016

O "AMERICANO" I - 1872 A 1904

6.26.5 - O Americano I - 1872 a 1904, Carris de Ferro do Porto, descrições várias, anuais de 1889 e 1895



O Americano iniciando a subida da Rua dos Clérigos com seis mulas e outro na Praça da Liberdade acrescentando outras para ajudar a subir a rua. Foto de Aurélio Paz dos Reis

Passados que foram os dois lançamentos intercalares referentes a fotografias antigas do Porto e o Natal no Porto, continuamos a descrição dos transportes públicos de passageiros, que vínhamos tratando:
O “Americano” foi um grande salto na comodidade dos transportes de passageiros do Porto, pois os desgraçados dos viajantes não tinham que se “crucificar nas próprias cruzes”, no dizer de Camilo. Pela primeira vez não suportavam os terríveis solavancos das péssimas ruas da cidade dado que se deslocava sobre uns carris estáveis e serenos.
O Porto foi a primeira cidade portuguesa a utilizar este tipo de transportes públicos. Verdadeiras caixas, inestéticas, com um varandim no topo e servidas por cavalos escorridos a puxá-las. Traquitanavam cidade fora, sobre a disciplina rígida de trilhos de ferro. A designação de "americano" provinha do facto de tais carruagens serem fabricadas nas oficinas estado-unidenses de John Stephenson & Company. Em 1858 Albino Francisco de Paiva Araújo solicitou ao Governo "concessão para estabelecer um caminho de ferro dos denominados americanos" entre esta cidade nortenha e a Foz. A autorização tardou e quem a obteria seria o barão da Trovisqueira, cerca de dez anos depois do primeiro pedido. Um decreto de 15 de Agosto de 1870 definia, por meio de cláusulas, as condições em que lhe era dada, ou à empresa que ele representasse, autorização para estabelecer à sua custa, na estrada pública entre a cidade do Porto e a povoação da Foz, esse meio de transporte. Partiria da Porta Nova, em Miragaia, por nessa altura ainda se trabalhar na abertura da Rua Nova da Alfândega. José Dionísio de Melo e Faro e António Tavares Basto foram os concessionários que se seguiram e aqueles que levaram por diante tal melhoramento para a Cidade Invicta.


Cordoaria - sala de estar do Porto até à inauguração do Palácio de Cristal em 1865

"Em 1873 era autorizado um ramal que principiando no lado norte do Largo dos Mártires da Pátria seguia toda a Rua da Restauração até entroncar na Alameda de Massarelos na citada via-férrea desta cidade à Foz e a Matosinhos. A empresa que recebeu por transferência do barão da Trovisqueira a exploração da linha marginal e do ramal tomou o extenso nome de Companhia Carril Americano do Porto à Foz e Matosinhos. A inauguração de tão importante serviço público foi em 15 de Maio de 1872, um ano antes de idêntico acontecimento se assinalar em Lisboa…


Logo da Carris de Ferro do Porto – 1873 a 1903

...Na sessão de 24 de Outubro foi deliberado por votos a qual conceder autorização camarária. Favoráveis a Vieira de Castro e Evaristo Pinto havia os votos de dois vogais. O parecer final transitou para a sessão de 27 de Março de 1873, e nessa foi aprovado por seis votos contra dois o pedido do grupo Vieira de Castro – Evaristo Pinto. Só em Agosto do ano seguinte seria assinado, nos Paços do Concelho, o contrato por meio do qual o negociante Vieira de Castro e o engenheiro Evaristo Nunes Pinto podiam estabelecer o caminho de ferro pelo sistema americano através das ruas da cidade, ligando bairros entre si e a estação do caminho de ferro de norte e sul com o centro da cidade. Nascia a Companhia Carris de Ferro do Porto. – de um artigo de J. Fernando Lopes 


Interessante o pormenor desta espécie de regulamento

O excelente livro de Manuel Castro Pereira, OS VELHOS ELÉCTRICOS DO PORTO, apresenta um elucidativo quadro da actividade dos transportes de passageiros da cidade do americano ao eléctrico:




Acções da Companhia Carris de Ferro do Porto


A propósito do Americano aqui vai um episódio contado pelo historiador Artur de Magalhães Basto na sua conferência aos alunos do Colégio Brotero em 26/6/1936:



Esta foto foi tirada entre 1888 e 1900, pois ainda não tinha sidoerigida a estátua do Infante D. Henrique e já se vê o Mercado Ferreira Borges. Repare-se que o Americano vai, a partir daqui, puxado por 6 mulas para poder subir a R. Mouzinho da Silveira. A designação de "americano" provinha do facto de tais carruagens serem fabricadas nas oficinas estado-unidenses de John Stephenson & Company. Ao fundo está o Palácio da Bolsa, da Associação Comercial do Porto. Começado a construir em 1842.
Do site da Associação Comercial do Porto retiramos o seguinte trechos: “Ao longo de três gerações, grandes nomes da arquitectura, da pintura, da escultura e das artes decorativas contribuíram para a criação de um espólio e um património único no Palácio da Bolsa, verdadeira jóia do estilo neoclássico do séc. XIX, do Arq. Joaquim da Costa Lima ao Arq. Marques da Silva, do Pintor António Ramalho, a Veloso Salgado, António Carneiro ou Medina, de Soares dos Reis a Teixeira Lopes.”


Na Praça da Batalha, em frente da Igreja de Santo Ildefonso


Hoje este gesto está morto - In O Tripeiro, Série VI, Ano IX


O Americano na Praça D. Pedro – Foto de Aurélio Paz dos Reis


Deliciosa descrição de Wendel Reis em O Tripeiro, Série V, Ano 1, em 1945


Na Foz do Douro - 1872

Recolhemos no Blogue Do Porto e Não só, este delicioso texto da passagem do Americano na Foz:
“Uma nuvem de poeira avisa que o americano está a chegar. A jornada desde Mathozinhos até à parte superior da cidade termina á entrada d'este jardim. Espera-o muita gente. Vem completamente cheio, mas tam depressa descarrega a sua carregação de banhistas da Foz, que se enche immediatamente e parte.” …
…“E uma estrada cheia de vida; assim tivesse menos pó, que forma sobre ella uma nuvem continua, em consequência do tranzito constante dos carros de bois, passando e repassando, de cavalgaduras, de pequenos carros de cortinas com gente da província, ou banhistas que não chegaram a tempo ou não acharam logar nos Americanos. De dez em dez minutos ou de quarto em quarto de hora, passa um d'estes Americanos com grande rapidez, correndo docemente pelos rails. Puxam-os trez mulas ou cavallos a par, e ao sopé da rampa accrescem mais duas guias para os carros que vão acima ou para a parte superior da cidade. Cazualmente passa um cavalleiro ou uma carruagem descoberta; mas carros e cavallos, particulares ou d'aluguer escasseam no Porto, que n'este ponto differe muito de Lisboa, onde superabundam excellentes.”…
…“Nos Americanos fuma-se pouco. Talvez que os senhores se não sintam bem sentados para aprazivelmente fumarem o seu cigarretto; ou será então que as bellezas da estrada em que vão absortos os fazem olvidar-se de tudo, como succede ás pessoas mais familiarizadas com aquella paizagem.”
…“Mas tam cheia de vida, tam divertida e encantadora é esta bella e antiga cidade, que passava ali todas as manhãs vindo e voltando nos Americanos, que são extremamente commodos; percorrem as duas milhas que medeam entre o Porto e este arrabalde quazi no terço do tempo que leva ordinariamente uma carruagem d'aluguer. O preço da passagem é seis vinténs. Os carros são espaçosos e arejados, sem sol nem poeira: toda a gente os frequenta. Começaram a circular no anno passado,segundo me dizem, e tem tido grande êxito.
Alguns d'estes Americanos param na rua dos Inglezes, na parte mais baixa da cidade, emquanto que outros levam os passageiros acima, ao topo do monte perto da Mizericordia. Vale bastante a pena de seguir para este ultimo ponto; a rampa é tão forte que duas ou trez vezes vi senhoras apearem e preferirem caminhar ao sol o ao pó com medo de que os carros se despenhassem. Mas tal accidente nunca se deu.”
Lady Jackson, (Catherine Hannah Charlotte Elliott) - Fair Lusitania – Formosa Lusitânia, traduzida e anotada por Camilo Castello Branco 1878.



O Americano já ia até à Estação de Campanhã – após 1875 – desenho de Christino


Anual de 1889


Anual de 1895 – este anual destinava-se à viagem entre o centro da cidade até à Foz, pela Boavista. O trajecto do centro à Boavista era feito em Americano e daí até à Foz na “Máquina”, que trataremos mais tarde.

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