domingo, 23 de abril de 2017

CONTRACTO DE EL-REI D. JOÃO I COM O BISPO E CABIDO

7.6 – Contrato de el-rei D. João I com o Bispo e Cabido - Rua Formosa, Centro Histórico do Porto, Casamento D. João I, Convento  e Igreja de S. Clara, Arquivo Hitórico do Porto


Gravura de J. Holland (1838) – Saída do Viático - Inicialmente chamada R. Formosa por D. João I, R. S. Nicolau (em 1788), R. Nova dos Ingleses (até 1883), Rua dos Ingleses (até 1890), actual R. do Infante D. Henrique.


Centro histórico do Porto – pormenor do mapa de Teles Ferreira - 1892

celebrou úteis
e contendas, persistia com tanto escândalo da Igreja.


chamava a sua Rua Formosa.

“E El Rei saiu daqueles paços em cima de um cavalo branco, em panos de ouro realmente vestido; e a rainha em outro tal, mui nobremente guarnida. Levavam nas cabeças coroas de ouro ricamente obradas de pedras de aljofar e de grande preço, não indo arredados um do outro, mas ambos a igual. Os moços de cavalos levavam as mais honradas pessoas que eram e todos de pé muito corregidos. E o arcebispo levava a Rainha da rédea. Diante iam pipas e trombetas e outros instrumentos que se não podiam ouvir. Donas filhas dalgo isso mesmo da cidade cantavam indo de trás, como é costuma de bodas. A gente era tanta que se não podiam reger nem ordenar pelo espaço que era pequeno dos paços à igreja e assim chegaram à porta da Sé, que era dali muito perto, onde dom Rodrigo, bispo da cidade, já estava festivalmente em pontifical revestido, Esperando com a cleresia. O qual os tomou pelas mãos, e demoveu a dizer aquelas palavras que a Santa Igreja manda que se digam em tal sacramento. Então disse a missa e pregação; e acabou seu ofício, tornaram El Rei e a Rainha aos paços donde partiram com semelhante festa, onde haviam de comer. As mesas estavam já guarnidas e todo o que lhe cumprira; não somente onde os noivos haviam de estar, mas aquelas onde era ordenado de comerem bispos e outras honradas pessoas de fidalgos e burgueses do lugar e donas e donzelas do paço e da cidade. E o mestre-sala da boda era Nuno Álvares Pereira, Condestável de Portugal; servidores de toalha e copa e doutros ofícios eram grandes fidalgos e cavaleiros, onde houve assaz de iguarias de desvairadas maneiras de manjares. Enquanto o espaço de comer durou, faziam jogos à vista de todos, homens que o bem sabiam fazer, assim como trepar em cordas e tornos de mesas e salto real e outras coisas de sabor; as quais acabadas, alçaram-se todos e começaram a dançar, e as donas em seu bando cantando a redor com grande prazer.” Crónica de D. João I de Fernão Lopes


Convento de Santa Clara: As Franciscanas Clarissas instalaram-se no séc. XIII num pequeno convento em Entre-os-Rios. Considerado um local perigoso pelas incursões castelhanas, pediram à rainha D. Filipa de Lencastre que as autorizasse a construir um novo convento no Porto, o que lhes foi autorizado por D. João I. Em 28 de Março de 1416 foi colocada a primeira pedra do convento na presença do rei e de seus filhos D. Fernando e D. Afonso. As freiras mudaram-se em 1427 e a igreja foi concluída em 1457. Entre 1708 e 1715 realizaram-se grandes obras de ampliação do convento. Com a morte da última freira foi encerrado em fins do séc. XIX.


Convento de Santa Clara – igreja e dormitórios




A partir de 1730 a igreja foi coberta pelas maravilhosas talhas joaninas, que a tornaram numa das jóias do barroco.


 Porto Medieval – In História do Porto – Luis Oliveira Ramos

“Há exactamente seiscentos anos, a 13 de Abril de 1406, o longo braço-de-ferro entre o clero e a burguesia portuense chegou, porém, ao fim. Entrava em vigor o acordo assinado em Fevereiro de 1405, em Montemor-o-Novo, e que estabeleceu a autonomia administrativa do Porto.



Carta foral dada por D. Hugo aos moradores do porto

Até então, e durante quase trezentos anos, a cidade fora propriedade do bispo, por força da doação que D. Teresa fez a D. Hugo em 18 de Abril de 1120.
A data que se assinala na próxima quinta-feira, e que não será objecto de nenhuma comemoração oficial, é considerada uma das mais significativas da história portuense, fundamental para aquilo que o Porto veio a ser: a 13 de Abril de 1406, a cidade deixou de estar sujeita a um regime senhorial e passou a ser um município sob jurisdição da Coroa portuguesa. 
"Os portuenses passavam, a partir daí, a ser senhores do seu próprio destino", assinala, num artigo recentemente publicado no Jornal de Notícias, o jornalista Germano Silva, um dos mais persistentes estudiosos da história da cidade.



Couto Episcopal do Porto

Ao abrigo do Estormento feito antre ellrey e o obispo do Porto sobre ajuridiçom, o rei D. João I e o bispo de então, D. Gil Alma, acordaram que o cabido cedia os direitos administrativos que exercia sobre a cidade, cabendo ao rei pagar, a título compensatório, três mil libras anuais ao bispo. Para assegurar o pagamento, logo D. João I assinalou todallas rrendas e penssõoes de todallas casas queo dito Senhor Rey ha na dita cidade do Porto. No caso de estas verbas não serem suficientes, o rei podia ainda recorrer às rendas da Alfândega, devendo o pagamento manter-se até à conclusão da actual Rua do Infante D. Henrique. 


Rua do Infante D. Henrique - gravura do Barão de Forrester

Depois disso, D. João I comprometia-se a ceder ao bispo, na nova artéria, tantas casas quantas fossem necessárias para perfazer o valor da indemnização.
No final do acordo firmado em 1405, e que viria a ser confirmado por escritura a 13 de Abril de 1406, o rei comprometia-se ainda a obter o acordo do Papa Inocêncio VI para o negócio. E sse por ventura o papa nom quiser outorgar esta conueença ataa huum ano do dia da feytura deste contrato, ou pelo dito Bispo e cabido ficar que se nom autorgue, que ellrey nom seia tehudo de dar estes dinheyros".
A bula papal acabaria por ser expedida a 9 de Outubro de 1405 para o bispo de Lisboa, D. João de Azambuja, que havia precedido D. Gil Alma na diocese do Porto, tendo a escritura pública de transferência da jurisdição da cidade sido assinada a 13 de Abril de 1406, no Paço Real de Santarém. Para além de D. João I e de D. João de Azambuja, estiveram presentes dois procuradores do bispo do Porto e João Afonso, chantre da diocese portucalense. Nesse mesmo dia, o rei ordenou a publicação da carta régia dando conhecimento do teor do acordo.
"Os bispos cederam porque, por mal, ia tudo de graça", sustenta D. Rodrigo da Cunha, historiador e arcebispo de Lisboa e Braga na primeira metade do século XVII, dando assim nota do clima de mal-estar que há muito se vivia na cidade, então com cerca de oito mil habitantes e ainda cercada pelas muralhas mandadas construir pelo rei D. Fernando, com cerca de três mil metros de extensão. O conflito era antigo (ver texto ao lado) e opunha ao cabido os mercadores, proprietários de navios, ourives-cambistas e agentes do fisco, os quais ocupavam já, segundo o historiador Armindo de Sousa, o poder autárquico da época, constituíam uma espécie de oligarquia hereditária e eram os interlocutores privilegiados da Coroa na cidade.


D.João I 

O Porto, nota Armindo de Sousa no livro Conflitos entre o bispo e a Câmara do Porto em meados do século XV, "buscava a dependência directa da Coroa, ciente de que por ela passava uma definição mais genuína das liberdades e uma mais sólida garantia dos seus interesses: uma cidade comercial sujeita a mero e misto império episcopal só a muito custo podia singrar. Não convinha, pois, ao burgo portuense um regime jurisdicional próprio das comunidades rurais".
Para além dos motivos que este trecho torna óbvios, à tomada de posição de D. João I não terá sido estranho o facto de o Porto ter sido, em 1383, a segunda cidade a aderir à causa do rei durante a guerra civil que se seguiu à morte de D. Fernando e à sua sucessão por D. Beatriz, casada com o rei de Castela. Provavelmente grato pela armada enviada pela cidade para socorrer a Coroa durante o cerco castelhano de Lisboa, em 1384, D. João escolheu o Porto para casar com D. Filipa de Lencastre, em 1387,



À direita registo das despesas do baptismo do Infante – Arquivo Municipal do Porto

e, depois, em 1394, para que aqui nascesse o infante D. Henrique, no edifício da Alfândega Régia (a actual Casa do Infante).
Apesar da importância atribuída à libertação do Porto do estatuto feudal em que viveu até então, não deverá deixar de se notar, seiscentos anos depois, que, apesar da jurisdição eclesiástica, sempre houve agentes do fisco régio nos limites do couto e que nem todos os cidadãos se reconheciam vassalos da mitra. De igual modo importa notar que, após o 13 de Abril de 1406, parte dos impostos continuaram a ser cobrados para sustentar o bispo, o cabido e a fábrica das igrejas, situação a que só Mouzinho da Silveira pôs cobro, em 1832, com a abolição dos forais.
Germano Silva, no já referido artigo, nota ainda que a Coroa nunca chegou a cumprir integralmente o acordo de Montemor-o-Novo, por causa das sucessivas desvalorizações da moeda. A questão em torno da jurisdição da muy nobre honrrada leal Cidade do Porto estava, em todo o caso, resolvida”. In Público – 9/4/2006

Arquivo Histórico do Porto

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