segunda-feira, 23 de outubro de 2017

TESTEMUNHOS E MEMÓRIAS SOBRE O PORTO - III

9.3 - Visita de D. Cósimo III de Medici em 1669 - II, Texto de António Coutinho Coelho, Gravuras do Porto - Muralha da Ribeira - S. Pantaleão - Serra do Pilar - Rio Douro, Descrição do Porto e do Rio Douro do séc. XVII.



Gravura do séc. XVIII 

O Porto, cidade antiquíssima, é famosa pelo celebrado desembarque dos franceses na foz daquele rio, onde dizem ter tomado o nome de Portugal, está situada sobre o rio Douro, onde começa a província de Entre Douro e Minho, sobre um lugar irregularíssimo formado pelas encostas de diversos montes, que ressaltando variadamente para fora ajudam a tornar mais desiguais os planos das ruas da cidade, exposta só pela parte que olha o rio, onde os muros que a cercam na totalidade se descobrem completamente de sobre a água, vendo-se debaixo, dos lados e por sobre o cume mais alto dos montes, à semelhança de uma coroa.


São estes muros à antiga, isto é, todos seguidos e ameados, mas a estrutura é belíssima, sendo todos de pedra viva talhada em quadrados e de notável grossura. A cidade, depois de Lisboa, tem fama, e com a maior justiça, de ser a mais bela e galante do reino. Não é muito grande, mas os edifícios são bons, as ruas limpas, alegres e lajeadas à maneira de Florença, com lajes todavia de menor tamanho, mas todas muito bem unidas e enquadradas. 


1960


A Catedral é uma igreja grande e magnífica com três naves; está aí o Santíssimo Sacramento todo de prata e de grandeza notável.



Ao lado do altar-mor, num cofre de prata dourada, que é muito estimado pelo trabalho, está o corpo de S. Pantaleão-mártir.


(Na Sé, a arca com as relíquias de S. Pan­taleão foi metida num artístico e valioso relicário de prata, mandado fazer por D. João II mas que só foi entregue à cidade, em 1502, pelo rei D. Manuel I, numa sua deslocação ao Porto. Foi a prata desse relicário que roubaram. 
O furto aconteceu em 1834, já depois do fim do Cerco do Porto. E ao que consta, o autor do roubo nunca foi descoberto. Melhor dizendo: parece que se soube quem foi. Mas o autor da façanha nunca foi denunciado 
Muitos anos mais tarde, em 1875, Pinho Leal, no seu muito apreciado e célebre dicionário "Portugal antigo e moderno", no volume sétimo e na parte respeitante ao Porto, ao tratar do assunto S. Pantaleão, alude também ao roubo da arca e escreve isto: "tinha muito que dizer sobre o roubo deste cofre, o que não faço por certas considerações, sendo a principal envolver neste abominável crime pessoas de alta categoria que se não podem defender por estarem já cobertas com a lousa da sepultura". 
Tudo muito estranho, não é ?" – Germano Silva)



…Da parte de lá do rio, sobre o cume dos Montes, está uma nova, grande e bela construção dos Cónegos regulares, a Igreja dos quais, ainda não acabada, é de arquitectura redonda, toda de pedra viva, e quase isolada.


Gravura de Manuel Marques de Aguilar, desde a Torre da Marca às Fontaínhas - 1791

Calculam na cidade 4 000 casas e pouco mais de 10 000 habitantes. Há aí pouquíssima nobreza, abundância de padres e frades e a gente, como em toda a província, paupérrima e súbdita dos Eclesiásticos, aos quais pertencem quase todas as rendas, que dizem ascender a dois milhões.


Gravura de Batty – 1829


Gravura de J. G. Martini - 1835

A subsistência da cidade é o porto, e, por consequência, o tráfego e o comércio, o qual porém está na mão de estrangeiros e, especialmente, dos ingleses.


Entrada do Douro – Teodoro de Sousa Maldonado – 1790


A barra está distante menos de meia légua, péssima e dificílima de atingir pela estreiteza e obliquidade do canal. 



Torre da Marca – Gravura de Manuel Marques de Aguilar - 1793 - In Portugal Antigo e Moderno

Para este fim, fora da cidade, sobre uma eminência donde se descobre o mar, está construída uma porta redonda num quadrado de muro isolado, que serve aos pilotos para atingir o rio com segurança, metendo a proa como se devessem entrar pelo meio da abertura daquela porta. 


Gravura de J. Holland – 1838 – vista para montante do rio, que nos parece tirada da zona da Arrábida

O rio está protegidíssimo do vento correndo inteiramente entre vertentes altíssimas de montes que, em parte pedregosos, e em parte frutíferos, cultivados e semeados de quintas e de fontes, dão um belíssimo aspecto à cidade. As águas, porém, tornam-no perigoso, pois que, quando acontece entrarem as marés com o vento, e saírem as cheias ruinosas, assim como no porto de Lisboa, as duas águas formam uma linha perigosa, onde nenhum navio, ainda que ancorado, poderia aguentar-se. Por isso retiram-se então para as margens, lançam as amarras à terra, não porque a âncora não seja bastante, mas porque desce dos montes vizinhos uma grande quantidade de areia, e a âncora ficaria aí enterrada, sendo impossível retirá-la. 


Entrada do Rio Douro - Teodoro de Sousa Maldonado - 1789 - Cabedelo tem o nº. 10

Dão porém estas cheias algum benefício à embocadura do porto, removendo sempre a areia, que torna apertada a barra.

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